terça-feira, 25 de maio de 2010

O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.

Não gosto das palavras fatigadas de informar.

Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão, tipo água, pedra, sapo.

Entendo bem o sotaque das águas.

Dou respeito às coisas desimportantes e aos seres desimportantes.

Prezo insetos mais que aviões.

Prezo a velocidade das tartarugas mais que a dos mísseis.

Tenho em mim esse atraso de nascença.

Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos.

Tenho abundância de ser feliz por isso.

Meu quintal é maior do que o mundo.

Sou um apanhador de desperdícios: amo os restos, como as boas moscas.

Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.

Porque eu não sou da informática: sou da invencionática...

Só uso a palavra para compor meus silêncios.

autor:

Manoel de Barros

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